sexta-feira, 10 de outubro de 2014

LENDAS IBIAPABANAS: O ASSOBIADOR


Meia noite, o silêncio rondava a mata. Piavam as corujas rasga-mortalhas. Fazia frio, a neblina cobria tudo, embora a lua estivesse cheia, era impossível ver alguma coisa do lado de fora pela fresta da pequena janela da casa de taipa.

Na camarinha dormiam todos os culumins deitados em suas redes, que se amontoavam umas sobre as outras; em baixo os mais novos,ainda mijões, por cima os mais velhos. Cândida e Antonio dormiam em outro quarto, junto com o culumim mais novo, que ainda não tinha dois anos, mas a meia-parede que separava os quartos, permitia que se tudo fosse observado e controlado. Do lado de fora havia o galinheiro, os cavalos e os jumentos que se encolhiam no canto do alpendre coberto de palhas, com o frio da noite.

De repente ouve-se um assobio, fino e persistente, que se aproxima da mata, um pouco distante, para o terreiro... as galinhas cacarejam. Era o aterrorizante assobiador que chegava perto. Os culumins acordaram, mas gelados de medo, ficaram calados, quietinhos, nem se mexiam, uns pularam na rede dos outros... Frasquim se mijou de medo!

Contava-se à calada da noite, em volta do fogão de lenha da cozinha que o assobiador era uma mulher que virava passarinho assobiador, era uma visagem.

Pras bandas do Amazonas o assobiador tinha o nome de “Matinta-Pereira”, e seu assobio era coisa de outro mundo, do mundo dos mortos, era alma penada, e diz-se que ela se desencantava em noites de lua cheia, manifestando-se com o pio da coruja. E assim ela vinha na casa dos vivos buscar tabaco.

Para ela não perturbar os viventes, o morador, quando prudente, já deixava, costumeiramente, a “masca de fumo” perto da porta de entrada, ou gritava lá de dentro: “Vem buscar fumo amanhã!”. Ao que o “assobiador” voltava no outro dia para pegar a sua oferenda ou ficava perturbando os colonos por noites adentro, assustando as crianças, ao ponto de as deixarem nervosas, medrosas e sem sono. Dizem que teve menino que ficou doido pelo resto da vida, vendo visagens por todo canto...

Assim sendo, o assobio aproximou-se, pouco a pouco. “Siiu... siiu... siiu... sa'sï...”, chegou perto da casa, e depois foi afastando-se lentamente, da mesma forma como chegara. Os culumins, mesmo com medo da assombração, já dormiam de novo. Cândida foi até a porta, olhou por baixo... “a pea de fumo” não estava mais lá... Voltou correndo p'ra rede, enrolou-se toda, dos pés à cabeça, só com o nariz de fora, tremendo de medo e não dormiu mais! Já eram duas da madrugada.

Imagem montada pelo autor.iconacional.com

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